Por Duda Tawil
Ela ganhou este apelido carinhoso, “Bomja”, dos seus moradores, todos apaixonados por ela: Bom Jesus dos Passos, verdadeiro paraíso tropical da Baía de Todos-os-Santos. A ilha não só é perto de Salvador, como pertence à capital da Bahia com h. É verdade que seu acesso marítimo é deficiente, ou quase inexistente, mas…ele existe, sim, felizmente. Você pega o ônibus por R$14 na estação rodoviária, pela Viação Jauá, em vários horários, e pela BR-324, após rápida parada na estação de Candeias, chega-se em Madre de Deus em 1h40. Não esquecer de pedir ao motorista para descer no ponto chamado Mirim, e de lá, por R$7, uma embarcação da Associação dos Barqueiros da Ilha de Bom Jesus dos Passos, a cada meia hora, desde cedo até de tardinha, lhe deixa num dos piers de “Bomja”. A partir daí, da beleza da travessia, o “tudo de bom” já é, está apenas começando!
Oficialmente um bairro da Cidade do Salvador desde 2017, de quatro anos para cá, a pequena ilha de 4000 habitantes vem se transformando em moradia definitiva de pessoas que ali nasceram ou têm seus antepassados, algumas delas com casas seculares, mesmo que simples. Pela qualidade de vida, a calma absoluta, a ausência total de carros, é um oásis onde muitos decidiram ficar para sempre. Aposentados principalmente, e na sua maioria, mulheres empreendedoras. A felicidade está no ar. Agora, o turismo sustentável é um sonho que virou realidade, e um desafio também.
Oriunda de uma sesmaria, como a maioria das ilhas da baía sem h, seu principal monumento é a Igreja de Bom Jesus dos Passos, do século XVIII, da qual retira o seu nome hoje, pois antes se chamava Pataibaaçu, ou Palmeira Grande. Inaugurada em 1761, a sua imagem mais antiga, de Nosso Sr. dos Passos, é de Félix Pereira, de 1762. Existem mais duas imagens, em tamanho maior, e uma delas sai às ruas na Sexta da Paixão.
Vice-provedor da Irmandade de Bom Jesus dos Passos e um dos seus moradores mais antigos, com sua casa ao lado da igreja, Alcemil Lima dos Santos, ou Seu Cici, conta que o mês de janeiro é todo de festas, em louvor ao Sr. dos Passos, São Benedito e Nossa Senhora dos Navegantes. Entre os festejos, uma procissão marítima, pois a imagem da Virgem é levada para a Igreja da Conceição da Praia, e depois da missa lá é acompanhada por 200 embarcações no seu retorno à ilha. Roque Lima é o provedor da irmandade. Irmandade que, sem poder pagar um funcionário, a igreja só fica aberta nos horários da missa.
Pioneiro do turismo na ilha, há 20 anos, Luis Antônio de Brito Correia é o proprietário da primeira pousada, a Pousada Di Luis (zap 71.99961-2919). Ele tem no seu mailing 3000 contatos, de gente do mundo todo que ali se hospedou. Filósofo formado pela UCSal e em Turismo pelo Cefet, ele está ali desde 1989. A pousada é básica, possui piscina e salão de televisão. Todos os 13 apartamentos, para duas até oito pessoas, com frigobar. Ele não serve café da manhã. O quarto para casal custa R$170 com ventilador e R$200 com ar-condicionado.
A Casa do Tamarineiro é uma deliciosa opção de locação para temporadas, AirBnb da jornalista Angélica Parras e seu marido Sinval Costa, matemático e funcionário aposentado da Petrobras na vizinha Madre de Deus, onde trabalhou durante anos. Ambos declaradamente apaixonados por Bomja. Está localizada na Rua da Igreja, cheia de charme e sempre mais bonita: “Queremos que as pessoas se sintam em casa. A maioria são amigos mesmo. E cada objeto da decoração tem um porquê, ou terá”, diz Angélica, entusiasta do destino. Com eles trabalham as gentis Célia e Eliene. Ampla, são oito quartos. Zap: (71) 99165-6772. Insta: @casadotamarineiro.
Opção de maior conforto da ilha é a pousada Bomja Village, de Ely de Alcântara Ramos. Apartamentos de extremo bom gosto, banheiros modernos, tevê e ar-condicionado, com café. Almoço e jantar podem ser providenciados também. Um bonito e florido jardim arborizado e flores, piscina, no coração do vilarejo. São os preços da alta estação: R$450 (duplo), R$600 (triplo) e R$800 (quádruplo). www.bomjavillage.com e Insta @bomjavillage.
A gastronomia é o ponto forte de Bomja, com barzinhos, bistrôs, quiosques e restaurantes que floresceram nos últimos meses, todos com seus donos à sua frente, e o amor em tudo que tocam. Filha da ilha, pois “só fiz nascer em Salvador e vim pra cá”, a cheffe Vanessa Soares, filha de Iemanjá com Xangô, tem o seu Das Águas, aberto na Marina do Porto em 2019. Formada em Administração pela Unijorge, dos seus bisavós, aos avós, ao seu pai hoje com 70 anos, e morador também, assim como seu irmão, todos vizinhos, todos são dali. De tendência raiz e sofisticada – segue o curso online de Gastronomia na Unifacs, ela inova nos seus pratos com produtos locais – os peguaris e os sambás galos (algúem já provou estes mariscos?) – em pratos tradicionais como a moqueca ou um belo espaguete.
Criativa, ganhou dois anos o prêmio Panela de Bairro, da Tevê Bahia, com a moqueca de fruta-pão e camarão seco em 2019, e a caldeirada nativa com frutos do mar, em 2021. Arrasa também nas pizzas (a de frutos do mar, óbvio, é imperdível) e nos camarões fritos e encapotados. Ela defende um melhor meio de transporte para a ilha: “Se tivesse um catamarã para cá, como já teve para Madre de Deus, seria perfeito! Como não temos muita hospedagem, as pessoas viriam para passar o dia”. Ela abre de quinta a domingo, das 11h à 0h, e nos sábados tem música ao vivo com artistas como Iane Gonzaga e Márcio Só. Nos outros dias, abre se houver reservas. Site: www.restaurantedasaguas.com, zap: (71) 99189-8713 e o Insta: @vanessa_ilhada.
Na Praça da Igreja, de quinta a domingo, tem o Casa de Vovó, de Thaiane Argolo. Ela serve café e é uma ótima opção de comida de raiz a kilo. Se for de dia, o visitante come à sombra de um flamboyant. À noite, menu à la carte. Insta: @casavovo2.
Pertinho, o Bistrô Na Larica, aberto em 2016, é das irmãs Gal e Cássia, na casa – e sobretudo na calçada! – onde praticamente nasceram e estão felizes da vida. O menuzinho tem toques gourmets de sofisticação, e com preços convidativos. São minihambúrgueres e hambúrgueres divinos, panqueca de camarão, e as massas, sendo o carro-chefe o espaguete de camarão ao molho gorgonzola. Bons vinhos nacionais e importados. “Começamos informalmente, recebendo amigos, e depois resolvemos abrir. A praça aqui fica cheia no verão!”, comemora a simpática Gal, amante das viagens, de onde se inspira para suas criações, e ex-funcionária administrativa das Obras Sociais Irmã Dulce. Abre somente às sextas e aos sábados. Zaps: (71) 99233-5450 e (71) 99204-4741 e o Insta @nalaricagourmet.
Na ponta da Praça da Igreja está o restaurante Pôr do Sol, de onde se avista o belo crepúsculo. Simples, uma casa com varanda, aberto em outubro passado por Heleno e sua mulher Celeste, mais a filha Andréa, todos Behrmann (existe uma influência alemã na ilha, contam seus moradores). É comida baiana com tempero tradicional, onde se destaca uma surpreendente salada de peguari, um molusco da baía, além das moquecas, como siri e camarão. Cerveja geladíssima e muita gentileza, o prazer em agradar. Abre todos os dias para almoço e jantar. Zap: (71) 98136-9438 e Insta @por_.dosol.
Com produtos diferenciados, o Empório Delivery surgiu há três meses e meio! É o “bebê” de Bomja. Apesar do nome, é uma pequena mercearia, tipo delicatessen e onde pessoas vêm das ilhas vizinhas comprar, como da Ilha dos Frades. Soteropolitana, Rosa Ramos era representante comercial da Nestlé, e sua mãe morava na ilha. Também faz delivery e com orgulho conta que continua a tradição da avó, a primeira comerciante da ilha, Raimunda Behrmann (a ilha é povoada de primos, por isso os mesmos sobrenomes) que tinha seu próprio saveiro para distribuição das mercadorias. Zap: (71) 99728-4305 e Insta @emporiodeliveryba.
No Pier do Bilito tem o quiosque Point do Galego de outra nativa, Anilma. São delas as melhores empadas de siri do pedaço, cujo cheiro é sentido de longe. Vende também salgados de forno, como de camarão, e sequilhos. Zap: (71) 99702-0551 e Insta @pointdogalego.
O aspecto humano da ilha é cativante, onde todos se conhecem e se cumprimentam. Cadeiras na porta de casa é um hábito. De repente, passa de bicicleta o vendedor de dendê, e no alto-falante, anuncia “o dendê de Valença”. Outra figura querida é Amelice de Souza Correia, aposentada de 59 anos, que na sua casa da pitoresca e colorida Rua da Igreja, faz e comercializa os melhores cavacos, doces e salgados, além das balas de coco. O seu telefone é (71) 98107-7645.
O turismo de esportes náuticos e passeios ao redor da ilha são garantidos pela Dr. Centelha. Por exemplo, a volta de 360° de Bomja e à graciosa Igreja de Loreto, contruída entre 1640 e 1645, na vizinha Ilha dos Frades. Contatos e mais informações: zap (71) 99275-7661 e Insta @Dr.centelha_turismo. Com suas “jangadas de fibra” para quatro pessoas, a Casa do Tamarineiro e a Bomja Village propõem passeios de dia todo entre R$400 e R$600 e mergulhos nas águas mornas de suas praias.
Nas suas lindas ruelas, canteiros são dedicados aos santos, com nichos e muitas flores, geralmente para as Nossas Senhoras. Eles estão nas fachadas das casas também, como os Santo Antônio em azulejo, uma tradição portuguesa.
A palavra final desta reportagem fica com Deni Brito, ex-funcionário de empresa marítima, personagem local, “sushizeiro” nas horas vagas, agitador de eventos, geralmente esportivos. É um verdadeiro promoter, que diz: “Trabalho para trazer um turismo diferenciado e temos de tomar cuidado com o turismo predatório”. Ela cita um exemplo: “A ilha não gosta de barulho. Aqui recebemos famílias, não tem carros e as crianças brincam nas ruas”. E completa: “É também uma ilha de serviços por causa dos eventos em Loreto, por isso oferecemos todo tipo de serviço de qualidade”.
Vamos combinar: Bomja não é tudo de bom?